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2.3 Bases e Coordenadas

Seja V o conjunto de todos os vetores no espaço tridimensional. Conforme discutido na Seção 2.2, se a, b e c são l.i., então qualquer vetor uV pode ser escrito como uma combinação linear destes vetores, i.e. existem escalares α, β e γ tal que

u=αa+βb+γc. (2.49)

Isso motiva a seguinte definição: uma base de V é uma sequência de três vetores l.i. de V.

A seguinte proposição vai nos fornecer a noção de coordenadas no espaço.

Proposição 2.3.1.

Seja B=(a,b,c) uma base de V. Então, dado qualquer uV, existe uma única tripla de escalares (α,β,γ) tais que

u=αa+βb+γc. (2.50)
Demonstração.

A existência dos escalares α, β e γ segue imediatamente do fato de que a, b e c são l.i. e, portanto, u pode ser escrito como uma combinação linear destes vetores (Consulte a Subseção 2.2.3).

Agora, para verificar a unicidade de (α,β,γ), suponhamos que existam α, β e γ tais que

u=αa+βb+γc. (2.51)

Subtraindo (2.51) de (2.50), obtemos

0=(αα)a+(ββ)b+(γγ)c. (2.52)

Como a, b e c são l.i., segue que88endnote: 8Pela definição de vetores linearmente independentes, consulte Seção 2.2.

αα=0,ββ=0,γγ=0, (2.53)

i.e. α=α, β=β e γ=γ. ∎

Refer to caption
Figura 2.7: Representação de um vetor u=(u1,u2,u3)B em uma dada base B=(a,b,c).

Desta última proposição, fixada uma base B=(a,b,c), cada vetor u é representado de forma única como combinação linear dos vetores da base, digamos

u=u1a+u2b+u3c, (2.54)

onde a sequência de escalares (u1,u2,u3) é chamada de coordenadas do vetor u na base B e escrevemos

u=(u1,u2,u3)B, (2.55)

para expressar o vetor u nas suas coordenadas na base B. Consulte a Figura 2.7.

Exemplo 2.3.1.

Fixada uma base B=(a,b,c), o vetor u de coordenadas

u=(2,2,3)B (2.56)

é o vetor

u=2a+2b3c. (2.57)

2.3.1 Operações de Vetores com Coordenadas

Na Seção 1.2, definimos as operações de adição, subtração e multiplicação por escalar do ponto de vista geométrico. Aqui, estudamos como estas operações são definidas a partir das coordenadas de vetores.

A partir daqui, assumimos dada uma base de vetores B=(a,b,c).

Adição

Dados vetores u=(u1,u2,u3)B e v=(v1,v2,v3)B, i.e.

u =u1a+u2b+u3c, (2.58)
v =v1a+v2b+v3c, (2.59)

a adição de u com v é a soma

u+v =u1a+u2b+u3cu
+v1a+v2b+v3cv (2.60)
=(u1+v1)a+(u2+v2)b+(u3+v3)c. (2.61)

Ou seja,

u+v=(u1+v1,u2+v2,u3+v3)B. (2.62)
Exemplo 2.3.2.

A adição do vetor

u=(2,1,3)B (2.63)

com o vetor

v=(1,4,5)B (2.64)

resulta no vetor

u+v =(2+(1),1+4,3+(5))B (2.65)
=(1,3,8)B. (2.66)

Vetor Oposto

O vetor oposto ao vetor u é

u =(u1a+u2b+u3cu) (2.67)
=(u1)a+(u2)b+(u3)c, (2.68)

ou seja,

u=(u1,u2,u3)B. (2.69)
Exemplo 2.3.3.

Dado o vetor v=(2,1,3)B, temos

v=(2,1,3)B. (2.70)

Subtração de Vetores

Lembrando que subtração de u com v é definida por

uv:=u+(v), (2.71)

temos que

uv =(u1,u2,u3)B
(v1,v2,v3)B (2.72)
=(u1,u2,u3)B
+(v1,v2,v3)B (2.73)
=(u1+(v1),u2+(v2),u3+(v3)) (2.74)
=(u1v1,u2v2,u3v3). (2.75)

Em resumo, a subtração de u com v é o vetor

uv=(u1v1,u2v2,u3v3). (2.76)
Exemplo 2.3.4.

Sejam os vetores

u=(2,1,3)B (2.77)

e

v=(1,4,5)B, (2.78)

temos que

uv =(2(1),14,3(5))B (2.79)
=(3,5,2)B. (2.80)

Multiplicação por Escalar

Dado um escalar α e um vetor u, temos a multiplicação por escalar

αu =α(u1a+u2b+u3cu) (2.81)
=(αu1)a+(αu2)b+(αu3)c, (2.82)

ou seja,

αu=(αu1,αu2,αu3). (2.83)
Exemplo 2.3.5.

Dado o vetor v=(2,1,3)B, temos

13v =13(2,1,3)B (2.84)
=(132,13(1),13(3)) (2.85)
=(23,13,1)B. (2.86)

2.3.2 Dependência linear

Vamos estudar como podemos analisar a dependência linear de vetores a partir de suas coordenadas. Assumimos fixada uma base B=(a,b,c).

Dois vetores

Na Proposição 2.2.1, provamos que dois vetores u, v são linearmente dependentes (l.d.) se, e somente se, um for múltiplo do outro, i.e. existe um número real α tal que

u=αv, (2.87)

sem perda de generalidade99endnote: 9Formalmente, pode ocorrer v=βu.. Em coordenadas, temos

(u1,u2,u3)B =α(v1,v2,v3)B (2.88)
=(αv1,αv2,αv3)B, (2.89)

donde

u1 =αv1, (2.90)
u2 =αv2, (2.91)
u3 =αv3. (2.92)

Concluímos que dois vetores são l.d. se, e somente se, as coordenadas de um deles forem, respectivamente, múltiplas (de mesmo fator) das coordenadas do outro.

Exemplo 2.3.6.

Estudamos os seguintes casos:

  1. a)

    Dois vetores l.d..

    Sejam

    u=(2,1,3)B (2.93)

    e

    v=(1,12,32)B. (2.94)

    Ao buscarmos por um escalar α tal que

    u=αv, (2.95)

    temos

    (2,1,3)Bu =α(1,12,32)Bv (2.96)
    =(αα2,3α2)B, (2.97)

    donde segue que

    2=α α=2 (2.98)
    1=α2 α=2 (2.99)
    3=3α2 α=2. (2.100)

    Concluímos que u=2v, logo u e v são l.d..

  2. b)

    Dois vetores l.i..

    Sejam, agora, os vetores

    u=(2,1,3) (2.101)

    e

    v=(2,12,32). (2.102)

    Buscando por α tal que

    u=αv, (2.103)

    chegamos no sistema de equações

    {2=2α1=α23=3α2 (2.104)

    que não tem solução. De fato, na primeira equação α=1, mas na segunda α=2, logo não existe α tal que u=αv. Concluímos que u e v são l.i..

Três Vetores

Na Subseção 2.2.2, estudamos que três vetores u, v e w são linearmente independentes (l.i.), quando

αu+βv+γw=0 (2.105)
α=β=γ=0.

Assumimos fixada uma base B=(a,b,c) no espaço. Então, temos que

αu+βv+γw=0 (2.106)

é equivalente a

α(u1,u2,u3)B
+β(v1,v2,v3)B
+γ(w1,w2,w3)B
=(0,0,0)B. (2.107)

ou, ainda,

(αu1+βv1+γw1,
αu2+βv2+γw2,
αu3+βv3+γw3)B
=(0,0,0)B. (2.108)

Esta, por sua vez, nos leva ao seguinte sistema linear

{u1α+v1β+w1γ=0u2α+v2β+w2γ=0u3α+v3β+w3γ=0 (2.109)

Agora, lembremos que um tal sistema tem solução única1010endnote: 10Neste caso, a solução trivial α=β=γ=0 se, e somente se, o determinante de sua matriz dos coeficientes é não nulo, i.e.

|u1v1w1u2v2w2u3v3w3|0. (2.110)

Neste caso, concluímos que {u,v,w} é um conjunto de vetores l.i. e, noutro caso, é l.d..

Exemplo 2.3.7.

Os vetores

u =(2,1,3)B,v =(1,1,2)B,w =(2,1,1)B, (2.111)

formam um conjunto l.d., pois

|u1v1w1u2v2w2u3v3w3| =|212111321| (2.118)
=243+641 (2.119)
=80. (2.120)

2.3.3 Bases Ortonormais

Uma base B=(i,j,k) é dita ser ortonormal1111endnote: 11Quando u ortogonal a v, denotamos uv., quando

  • i, j e k são dois a dois ortogonais, e

  • i=j=k=1.

Refer to caption
Figura 2.8: Representação gráfica de uma base ortonormal de vetores.
Lema 2.3.1.

(Pitágoras1212endnote: 12Pitágoras de Samos, c.570, c. 495 a.C., matemático grego jônico. Fonte: Wikipédia:Pitágoras..) Se uv, então

u+v2=u2+v2. (2.121)
Demonstração.

Consulte o E.2.3.7. ∎

Proposição 2.3.1.

Seja B=(i,j,k) uma base ortonormal e u=(u1,u2,u3)B. Então,

u=u12+u22+u32. (2.122)
Demonstração.

Temos u2=u1i+u2j+u3k2. Seja π um plano determinado por dadas representações de i e j. Como i, j e k são ortogonais, temos que k é ortogonal ao plano π. Além disso, o vetor u1i+u2j também admite uma representação em π, logo u1i+u2j é ortogonal a k. Do Lema 12, temos

u2=u1i+u2j2+u3k2. (2.123)

Analogamente, como u1iu2j, temos

u2 =u1i2+u2j2+u3k2 (2.124)
=|u1|2i+|u2|2j+|u3|k2 (2.125)
=u12+u22+u32. (2.126)

Extraindo a raiz quadrada de ambos os lados da última equação, obtemos o resultado desejado. ∎

A partir daqui, salvo dito o contrário, vamos assumir fixada uma base ortonormal B=(i,j,k) e, por simplicidade, escrevemos

u =(u1,u2,u3) (2.127)
=u1i+u2j+u3k. (2.128)
Exemplo 2.3.8.

A norma de u=(1,2,2) é

u =(1)2+22+(2)2 (2.129)
=7. (2.130)

2.3.4 Exercícios Resolvidos

ER 2.3.1.

Considere a base B=(i,j,k) ortonormal conforme dada na Figura 2.8. Faça uma representação do vetor

u=(2,12,1)B. (2.131)
Solução.

Primeiramente, observamos que

u =(2,12,1)B (2.132)
=2i+12j+k. (2.133)

Assim sendo, podemos construir uma representação de u como dada na figura abaixo. Primeiramente, representamos os vetores 2i e 12j (cinza). Então, representamos o vetor 2i+12j (cinza). Por fim, temos a representação de u (vermelho).

[Uncaptioned image]
ER 2.3.2.

Fixada uma base qualquer B e dados u=(1,1,2)B e v=(2,1,1)B, encontre o vetor x que satisfaça

u+2x=v(x+u). (2.134)
Solução.

Primeiramente, podemos manipular a equação de forma a isolarmos x como segue

u+2x=v(x+u) (2.135)
2x=u+vxu (2.136)
3x=v2u (2.137)
x=13v23u (2.138)

Agora, sabendo que u=(1,1,2)B e v=(2,1,1)B, temos

x=13(2,1,1)B23(1,1,2)B (2.139)
x=(23,13,13)B(23,23,43)B (2.140)
x=(2323,13+23,1343) (2.141)
x=(43,1,53)B. (2.142)
ER 2.3.3.

Fixada uma base B qualquer, verifique se os vetores u=(1,1,2)B, v=(2,1,1)B e w=(4,3,5) também formam um base para o espaço de vetores.

Solução.

Uma base para o espaço tridimensional V é uma sequência de três vetores l.i.. Logo, para resolver a questão, basta verificar se (u,v,w) é l.i.. Com base na Subseção 2.3.2, basta calcularmos o determinante da matriz cujas colunas são formadas pelas coordenadas dos vetores da sequência, i.e.

|u1v1w1u2v2w2u3v3w3| (2.146)
=|124113215| (2.150)
=5412(8310) (2.151)
=21+21=0. (2.152)

Como este determinante é nulo, concluímos que (u,v,w) é l.d. e, portanto, não forma uma base para V.

2.3.5 Exercícios

E. 2.3.1.

Considere a base B=(i,j,k) conforme dada na Figura 2.8. Faça um esboço do vetor u=(1,1,12)B.

E. 2.3.2.

Fixada uma base B=(i,j,k) e sabendo que v=(2,0,3)B, escreva v como combinação linear de i, j e k.

Resposta.

v=2i+0j3k

E. 2.3.3.

Fixada uma base B qualquer e a=(0,1,1)B, b=(2,0,1)B e c=(12,13,1)B, calcule:

  1. a)

    6c

  2. b)

    b

  3. c)

    cb

  4. d)

    2c(ab)

Resposta.

a) 6c=(3,2,6)B; b) b=(2,0,1)B; c) cb=(32,13,2)B; d) 2c(ab)=(3,13,0)B

E. 2.3.4.

Faxada uma base B qualquer, verifique se os seguintes conjuntos de vetores são l.i. ou l.d..

  1. a)

    i=(1,0,0)B, j=(0,1,0)B

  2. b)

    a=(1,2,0)B, b=(2,4,1)B

  3. c)

    a=(1,2,0)B, c=(2,4,0)B

  4. d)

    i=(1,0,0)B, k=(0,0,1)B

  5. e)

    j=(0,1,0)B, k=(0,0,1)B

  6. f)

    a=(1,2,1)B, d=(12,1,12)B

Resposta.

a) l.i.; b) l.i.; c) l.d.; d) l.i.; e) l.i.; f) l.d.

E. 2.3.5.

Faxada uma base B qualquer, verifique se os seguintes conjuntos de vetores são l.i. ou l.d..

  1. a)

    i=(1,0,0)B, j=(0,1,0)B, k=(0,0,1)B

  2. b)

    a=(0,1,1)B, b=(2,0,1), c=(12,13,1)B

  3. c)

    u=(0,1,1)B, v=(2,0,1), w=(2,1,0)B

Resposta.

a) l.i.; b) l.i.; c) l.d.

E. 2.3.6.

Seja B=(a,b,c) uma base ortogonal, i.e. a, b e c são l.i. e dois a dois ortogonais. Mostre que C=(a/|a|,b/|b|,c/|c|) é uma base ortonormal.

Resposta.

Segue imediatamente do fato de que |u/|u||=1 para qualquer vetor u0.

E. 2.3.7.

Demostre o Lema 12.

Resposta.
[Uncaptioned image]

Sejam as representações u=AB, v=BC e, portanto, u+v=AC. Como uv, temos que o triângulo ABC é retângulo e, pelo Teorema de Pitágoras, segue que AC2=AB2+BC2. Logo, u+v2=u2+v2.


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