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3.3 Teorema do valor médio

O teorema do valor médio é uma aplicação do teorema de Rolle.

3.3.1 Teorema de Rolle

O Teorema de Rolle fornece uma condição suficiente para que uma dada função diferenciável tenha derivada nula em pelo menos um ponto.

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Figura 3.8: Ilustração do Teorema de Rolle.
Teorema 3.3.1.

(Teorema de Rolle) Seja f uma função contínua no intervalo fechado [a,b] e diferenciável no intervalo aberto (a,b). Se

f(a)=f(b), (3.51)

então existe pelo menos um ponto crítico c(a,b) tal que

f(c)=0. (3.52)
Demonstração.

A ideia da demonstração é uma consequência dos teoremas 25 e 3.2.2. O primeiro, que existem pontos de mínimo e máximos globais m,M[a,b], i.e.

f(m)f(x)f(M). (3.53)

Se m=M, então f é uma função contínua, donde segue que f(x)=0 para todo x(a,b). Agora, se mM, então m ou M é um extremo local. Sem perda de generalidade, supomos que c=m seja o mínimo local. Neste caso, o teorema 3.2.2 nos garante que f(c)=0. ∎

Exemplo 3.3.1.

O polinômio p(x)=x34x2+3x+1 tem pelo menos um ponto crítico no intervalo (0,1) e no intervalo (1,3). De fato,temos p(0)=p(1)=1 e, pelo teorema de Rolle, segue que existe pelo menos um ponto c(0,1) tal que f(c)=0. Analogamente, como também p(1)=p(3)=1, segue do teorema que existe pelo menos um ponto crítico no intervalo (1,3). Veja o esboço do gráfico de p na Figura 3.9.

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Figura 3.9: Esboço do gráfico de p(x)=x34x2+3x+1.

De fato, como todo polinômio é derivável em toda parte, podemos calcular os pontos críticos como segue.

p(x)=0 3x28x+3=0 (3.54)
x=8±6436276 (3.55)
x1=4730,45oux2=4+732,22. (3.56)

Podemos usar os seguintes comandos2626endnote: 26Veja a Observação 3.0.1. para computar os pontos críticos de p e plotar seu gráfico:

>>> p = x**3 - 4*x**2 + 3*x + 1
>>> pc = solve(p.diff()); pc
[-sqrt(7)/3 + 4/3, sqrt(7)/3 + 4/3]
>>> plot(p,(x,-0.5,3.5))
Exemplo 3.3.2.

Vejamos os seguintes casos em que o Teorema de Rolle não se aplica:

  1. a)

    A função

    f(x)={x,0x<1,0,x=1. (3.57)

    é tal que f(0)=f(1)=0, entretanto sua derivada f(x)=1 no intervalo (0,1). Ou seja, a condição da f ser contínua no intervalo fechado associado é necessária no teorema de Rolle. Veja a Figura 3.10 para o esboço do gráfico desta função.

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    Figura 3.10: Esboço do gráfico da função referente ao Exemplo 3.3.2 a).
  2. b)

    Não existe ponto tal que a derivada da g(x)=|x1|+1 seja nula. Entretanto, notemos que g(0)=g(2)=0 e g contínua no intervalo fechado [0,2]. O teorema de Rolle não se aplica neste caso, pois g não é derivável no intervalo (0,2), mais especificamente, no ponto x=1. Veja a Figura 3.11.

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    Figura 3.11: Esboço do gráfico da função referente ao Exemplo 3.3.2 b).

3.3.2 Teorema do valor médio

O teorema do valor médio é uma generalização do teorema de Rolle.

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Figura 3.12: Ilustração do Teorema do valor médio.
Teorema 3.3.2.

(Teorema do valor médio2727endnote: 27Também conhecido como Teorema de Lagrange.) Seja f uma função contínua no intervalo fechado [a,b] e diferenciável no intervalo aberto (a,b). Então, existe pelo menos um ponto c(a,b) tal que

f(b)f(a)ba=f(c). (3.58)
Demonstração.

O resultado segue da aplicação do Teorema de Rolle LABEL:teo:rolle a seguinte função

F(x)=f(x)f(a)f(b)f(a)ba(xa) (3.59)

De fato, F é contínua em [a,b], diferenciável em (a,b) e F(a)=F(b). Logo, existe c(a,b) tal que

F(c)=0 (3.60)
f(c)+f(b)f(a)ba=0 (3.61)
f(b)f(a)ba=f(c) (3.62)

Observação 3.3.1.

Em um contexto de aplicação, o Teorema do valor médio relaciona a taxa de variação média da função em um intervalo [a,b] com a taxa de variação instantânea da função em um ponto interior deste intervalo.

Exemplo 3.3.3.

A função f(x)=x2 é contínua no intervalo [0,2] e diferenciável no intervalo (0,2). Logo, segue do teorema do valor médio que existe pelo menos um ponto c(0,2) tal que

f(c)=f(2)f(0)20=2. (3.63)

De fato, f(x)=2x e, portanto, tomando c=1, temos f(c)=2.

Corolário 3.3.1.

(Funções com derivadas nulas são constantes) Se f(x)=0 para todos os pontos em um intervalo (a,b), então f é constante neste intervalo.

Demonstração.

De fato, sejam x1,x2(a,b) e, sem perda de generalidade, x1<x2. Então, temos f é contínua no intervalo [x1,x2] e diferenciável em (x1,x2). Segue do teorema do valor médio que existe c(x1,x2) tal que

f(x2)f(x1)x2x1=f(c). (3.64)

Como f(c)=0, temos f(x2)=f(x1). Ou seja, a função vale sempre o mesmo valor para quaisquer dois pontos no intervalo (a,b), logo é constante neste intervalo. ∎

Corolário 3.3.2.

(Função com a mesma derivada diferem por uma constante) Se f(x)=g(x) para todos os pontos em um intervalo aberto (a,b), então f(x)=g(x)+C, C constante, para todo x(a,b).

Demonstração.

Segue, imediatamente, da aplicação do corolário anterior à função h(x)=f(x)g(x). ∎

Corolário 3.3.3.

(Monotonicidade e o sinal da derivada) Suponha que f seja contínua em [a,b] e derivável em (a,b).

  1. a)

    Se f(x)>0 para todo x(a,b), então f é crescente2828endnote: 28f é função crescente em um intervalo I, quando x1>x2 em I implica f(x1)>f(x2). em [a,b].

  2. b)

    Se f(x)<0 para todo x(a,b), então f é decrescente2929endnote: 29f é função decrescente em um intervalo I, quando x1>x2 em I implica f(x1)<f(x2). em [a,b].

Demonstração.

Vamos demonstrar o item a), i.e. se f(x)>0 para todo x(a,b), então f é crescente em [a,b]. Sejam x1<x2 com x1,x2[a,b]. Observamos que f é contínua em [x1,x2] e diferenciável em (x1,x2). Logo, pelo Teorema do valor médio 27, temos que existe c(x1,x2) tal que

f(x2)f(x1)x2x1=f(c) (3.65)

ou, equivalentemente,

f(x2)f(x1)=f(c)(x2x1). (3.66)

Como f(x)>0 para todo x(a,b) e x2x1>0, concluímos que f(x2)f(x1)>0, i.e.

f(x1)<f(x2). (3.67)

Com isso, mostramos que se x1<x2 com x1,x2[a,b], então f(x1)<f(x2), i.e. f é crescente em [a,b].

A demonstração do item b) é análoga, consulte o Exercício 3.3.6. ∎

Exemplo 3.3.4.

Vamos estudar a monotonicidade da função polinomial f(x)=x34x2+3x+1. Na Figura 3.13, temos o esboço de seu gráfico.

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Figura 3.13: Esboço do gráfico de f(x)=x34x2+3x+1.

Podemos usar o Corolário 3.3.3 para estudarmos a monotonicidade (i.e. intervalos de crescimento ou decrescimento). Isto é, fazemos o estudo de sinal da derivada de f. Calculamos

f(x)=3x28x+3. (3.68)

Logo, temos

[Uncaptioned image]

Ou seja, f(x)<0 no conjunto (,473)(4+73,) e f(x)<0 no conjunto (473,4+73). Concluímos que f é crescente nos intervalos (,473] e [4+73,), enquanto que f é decrescente no intervalo [473,4+73].

Exemplo 3.3.5.

A função exponencial f(x)=ex é crescente em toda parte. De fato, temos

f(x)=ex>0, (3.69)

para todo x.

3.3.3 Exercícios resolvidos

ER 3.3.1.

Um carro percorreu 150 km em 1h30min. Mostre que em algum momento o carro estava a uma velocidade maior que 80 km/h.

Solução.

Seja s=s(t) a função distância percorrida pelo carro e t o tempo, em horas, contado do início do percurso. Do teorema do valor médio, exite tempo t1(0, 1,5) tal que

f(t1)=s(1,5)s(0)1,50=1501,5=100km/h. (3.70)

Ou seja, em algum momento o carro atingiu a velocidade de 100 km/h.

ER 3.3.2.

Estude a monotonicidade da função gaussiana f(x)=ex2.

Solução.

Para estudarmos a monotonicidade de uma função, podemos fazer o estudo de sinal de sua derivada. Neste caso, temos

f(x)=2xex2. (3.71)

Assim, vemos que

[Uncaptioned image]

Concluímos que f é crescente no intervalo (,0) e decrescente no intervalo (0,).

3.3.4 Exercícios

E. 3.3.1.

Estude a monotonicidade de f(x)=x22x.

Resposta.

Decrescente: (,1]; Crescente: [1,)

E. 3.3.2.

Estude a monotonicidade de f(x)=x33x.

Resposta.

Decrescente: [1,1]; Crescente: (,1]; [1,)

E. 3.3.3.

Estude a monotonicidade de f(x)=lnx.

Resposta.

Crescente: (0,)

E. 3.3.4.

Estude a monotonicidade de f(x)=xex.

Resposta.

Crescente: (,1); Decrescente de (1,)

E. 3.3.5.

Demonstre que um polinômio cúbico pode ter no máximo 3 raízes reais.

Resposta.

Dica: use o teorema de Rolle.

E. 3.3.6.

Seja f contínua em [a,b] e derivável em (a,b). Mostre que se f(x)<0 para todo x(a,b), então f é decrescente em [a,b].

Resposta.

Dica: consulte a demonstração do item a) do Corolário 3.3.3.


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